Publicação britânica é enfática ao dizer que cidades só evoluem se derem preferência a transporte público e pessoas no espaço urbano. E exaltou um exemplo para os planejadores: “agir agora, ajustar depois”.
ADAMO BAZANI
Uma cidade só pode ser considerada inovadora e com capacidade de evoluir, se privilegiar no seu espaço, o transporte coletivo e a circulação de pedestres. E os seus gestores devem ter coragem de inovar, mesmo enfrentando críticas dos setores mais conservadores. É a filosofia do “agir agora, ajustar depois”, que não significa falta de planejamento ou inconsequência, mas sair dos discursos apenas.
É o que mostra o jornal britânico The Guardian em uma série especial sobre a história das cidades.
Em relação ao Brasil, a publicação no dia 6 de maio de 2016, exaltou Curitiba, dizendo que seu exemplo histórico a torna “ a capital verde, a cidade mais inovadora do mundo”, diferentemente do “elefante branco” que se tornou Brasília do ponto de vista urbanístico – https://www.theguardian.com/cities/2016/may/06/story-of-cities-37-mayor-jaime-lerner-curitiba-brazil-green-capital-global-icon
Uma das diferenças apontadas pela publicação internacional, é que enquanto Brasília criou setores ou as áreas segregadas, Curitiba foi concebida de forma integrada, para atender a todas as demandas: trabalho, mobilidade e lazer.
A IMPORTÂNCIA DO BRT PARA UMA CIDADE MAIS DEMOCRÁTICA:
A publicação ouviu o arquiteto urbanista Jaime Lerner, que foi prefeito de Curitiba nos anos 1970. Jaime Lerner foi o responsável pela criação, em 1974, do primeiro BRT do mundo – sistema de corredores de ônibus que, de acordo com a reportagem, revolucionou a forma de pensar as cidades.
Enquanto nesta época o Brasil tentava investir em metrô, mas não conseguia os avanços necessários por causa do custo e da complexidade de implantação do modal, Curitiba se organizava pelos serviços de transportes em superfície.
São três inovações principais associadas ao BRT – Bus Rapid Transit: um sistema de plataformas com acessibilidade – as estações-tubo, pagamento antecipado de tarifa – sem a necessidade de o motorista lidar com dinheiro e os ônibus biarticulados, com maior capacidade de transportar até 250 passageiros.
Vale ressaltar que não entra nessa discussão se o hoje o sistema de BRT precisa de melhorias ou se é suficiente para atender à demanda. E nem tão pouco restringir as discussões sobre mobilidade em rivalizar modais, o que é uma bobagem. O que a publicação enfatiza é a importância dos corredores de ônibus não só para os transportes, mas para organização física e até mesmo democratização do espaço urbano, gerando inclusive ganhos sociais.
CALÇADÃO É O MAIOR EXEMPLO DO “AGIR AGORA, PARA AJUSTAR DEPOIS”
O calçadão da rua XV de Novembro foi considerado como a primeira “ideia radical”, no bom sentido do termo, para transformação urbana.
A história do calçadão é bem interessante.
Inicialmente quando foi apresentada a ideia por Jaime Lerner, houve uma verdadeira grita, principalmente por parte de comerciantes, que queriam que seus clientes continuassem estacionando os carros bem em frente aos seus estabelecimentos. Hoje isso ainda é muito comum em São Paulo, por exemplo, em relação às ciclovias e faixas de ônibus.
Os comerciantes e alguns moradores então entraram com uma liminar judicial para impedir que o calçadão fosse construído.
Jaime Lerner, ainda prefeito em seu primeiro mandato, adotou uma estratégia. Resolveu construir parte do calçadão como uma primeira demonstração do que viria. Lerner esperou que o tribunal fechasse noite de sexta-feira e, entre a madrugada de sexta para sábado e a segunda-feira de manhã, construiu um pedaço do calçadão. Não dava mais para demolir e a atitude teve um efeito positivo sentido meses depois.
Esse exemplo é considerado fundamental para os administradores públicos hoje: primeiro não se intimidar em relação às críticas, principalmente dos setores mais conservadores, depois não ficar só no planejamento e anúncios, mas “agir agora, ajustar depois”. – filosofia adota por Jaime Lerner.
O LIXO QUE NÃO É LIXO:
Outro exemplo citado pelo The Guardian é o sistema de destinação e aproveitamento de lixo, que criou também uma cultura em Curitiba. O termo lixo que não é lixo se tornou uma das expressões curitibanas mais famosas.
O projeto foi criado em 1989. Para estimular a população na época, o lixo era trocado por vale-transporte. Isso ajudou a resolver o problema do descarte irregular .
Hoje, lixo reciclável é trocado por hortifrutigranjeiros.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
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