“Renovação” dos ônibus municipais é feita apenas com veículos usados de outros sistemas
ADAMO BAZANI
Os passageiros de ônibus de Santo André, no ABC Paulista, nunca pegaram ônibus tão velhos desde o início das operações do Consórcio União Santo André, em 2008.
A média de idade dos ônibus do Consórcio, que responde por cerca de 75% dos transportes da cidade é de 6,22 anos. Bem acima, portanto, do contrato de concessão, que estipula média de cinco anos para toda a frota e idades máximas de oito anos para ônibus convencionais, micros e micrões e 12 anos para articulados.
Já a idade média dos ônibus da Suzantur, que opera as linhas tronco-alimentadoras da Vila Luzita, segundo a prefeitura de Santo André, é de 4,17 anos.
A empresa reponde por cerca de um quarto do sistema e opera a título precário (provisoriamente) até a realização de uma licitação das 15 linhas que deve ocorrer em março.
Entre Consórcio União Santo André, formado por várias empresas, e Suzantur, a idade dos ônibus na cidade está acima também do permitido: 5,92 anos.
Todo o sistema da cidade possui 393 ônibus que transportaram em todo o ano passado, 52,4 milhões de passageiros (Veja abaixo).
Os dados foram obtidos pelo Diário do Transporte por meio da Lei de Acesso à informação.
As renovações de frota que as empresas da cidade têm feito são com ônibus usados de outros sistemas, dentro da idade máxima permitida, mas os veículos têm apresentado problemas de operação e não têm as características de portas que os passageiros do ABC estão acostumados.
Na quarta-feira da semana retrasada, por exemplo, um longo congestionamento se formava por volta das 15h00 na Avenida Dom Pedro II, sentido São Caetano do Sul, que só tem duas faixas e é uma das principais vias da cidade de Santo André. Quando a reportagem do Diário do Transporte, que se dirigia para outra pauta, se aproximou da entrada principal do Parque Prefeito Celso Daniel, a razão do congestionamento era facilmente compreendida: um ônibus da Viação Guaianazes, usado do Rio de Janeiro, na linha B 21 (Cidade São Jorge – Bairro Campestre) estava quebrado.
A Viação Guaianazes e a ETURSA – Empresa de Transporte Urbano Rodoviário de Santo André têm operado com ônibus usados também de Indaiatuba, no interior de São Paulo, onde o dono destas companhias, o empresário Ronan Maria Pinto, deixou de operar os transportes municipais em 2016.
“É horrível este ônibus, tem porta no meio para descer, mas não tem porta traseira. Aí a gente vai para o fundo e quando quer descer tem que voltar para a metade do ônibus lotado. Quase perdi o ponto várias vezes e tenho que gritar com o motorista” – disse Jennifer Aielo, estudante de 18 anos, que utiliza a linha I 04 Jardim Las Vegas/Parque Capuava, operada pela ETURSA.
“Esses ônibus fazem muito barulho por dentro, não são nada confortáveis, os motoristas não são educados. Uso ônibus em Santo André porque preciso. Se eu pudesse pulava da minha casa para o trólebus ou para o trem direto” – disse o vendedor Gustavo de Moura, que precisa ir sempre para São Paulo, mas antes usa os ônibus da linha I04 também.
Na linha B 19 – Jardim Aclimação/Rodoviária, operada pela EUSA – Empresa Urbana Santo André, as queixas em relação à baixa qualidade de frota também não faltam.
“Falaram que trocaram os ônibus nesta linha. Só se trocaram os velhos por menos velhos, porque tá tudo a mesma coisa. Outro dia, o motorista teve de parar e encostar o ônibus na guia porque disse que o freio estava falhando” – disse a aposentada Maria de Fátima Assis.
A EUSA é do empresário Baltazar José de Sousa, que não opera mais ônibus municipais em Mauá, também no ABC, e usa alguns dos ônibus que eram da cidade vizinha, em Santo André.
Já na linha I07 (Bairro Paraíso/Vila Lucinda), operada pela Viação Guianazes, a queixa é sobre os micro-ônibus.
“Essa linha é cheia, tem bastante gente, e só vem esses micrinhos. Precisa de ônibus de verdade, de empresa de verdade. Fora que a conservação é péssima. A cada troca de marcha que o motorista faz parece que vai estourar tudo. Fora que os motoristas são mal humorados, não têm uniformes. Parece uns bicheiros dirigindo o ônibus, camisa aberta, calça levantada, barba mal feita. Se eu vou trabalhar desse jeito, eu estou demitido, mas um dia me disseram. Empresa ruim, funcionário ruim…” – reclama o metalúrgico Paulo Almeida de Castro
Na linha B 63 (Jardim Alvorada / Vila Palmares), operada pela Viação Vaz, as reclamações são do tamanho do ônibus e uma regra da empresa que não permite que os motoristas abram a porta do meio por causa do elevador para cadeira de rodas. As fábricas projetam as portas com elevadores para receberem qualquer tipo de fluxo de passageiros, mesmo sem o equipamento acionado.
“Primeiro que essa linha só tem micrão. Uma droga. No horário de pico, vamos espremidos. Não é lotado, é superlotado. Essa linha é para ônibus normal. E essa empresa tem ainda uma coisa que irrita. Ela não deixa o motorista abrir a porta do meio. Por ser micrão, esse ônibus tem corredor mais estreito, aí para descer não tem jeito, as pessoas acabam se empurrando para chegar no fundo do ônibus e a porta do meio lá, fechadona. Já vi confusão.” – disse revolta a dona de casa Neucy Lima.
Já na linha I08, Jardim das Maravilhas/Bairro Paraíso, da Parque das Nações, a queixa é que os ônibus não têm elevadores para pessoas com deficiência, mesmo passando pela maior parte dos grandes hospitais públicos e particulares, e a idade dos veículos.
“Pense numa escola de samba desafinada. É o que você ouve num ônibus da I08. Bate tudo. Eu conheço esses ônibus, foram comprados em 2007 e começaram em 2008, ainda quando tinha a faixinha vermelha do outro prefeito. Poxa, este ônibus é opção para o Hospital Bartira, Hospital Municipal [de Santo André]; Hospital Celso Gama, Hospital Brasil, Hospital Mário Covas….e só alguns têm elevadores. E ainda sim, vieram usados” – disse o ferramenteiro Wilson Souza que ainda completou. “Sempre que dá, racho um Uber com vizinhos quando preciso ir para o Centro. Cada um paga mais barato que se pegarmos o ônibus aqui de Santo André, que roda pouco e é caro.”
SISTEMA DE SANTO ANDRÉ PERDEU CINCO MILHÕES DE PASSAGEIROS EM UM ANO
De 2016 a 2017, os ônibus municiais de Santo André registraram quase cinco milhões a menos de passageiros.
Ainda segundo os dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, em 2016, foram 57,32 milhões (57.323.767) registros de passagens pelo sistema de ônibus de Santo André. Já no ano de 2017, este número caiu para 52,49 milhões (52.491.822).
Isso significa que entre 2016 e 2017, 10,12 % de passageiros deixaram de usar ônibus na cidade.
RESPOSTAS:
Desde o dia 06 de fevereiro o Diário do Transporte pede uma resposta da prefeitura de Santo André sobre as providências do poder público quanto à frota antiga e os motivos pelos quais a prefeitura entende que justificariam a queda de demanda.
Mas a área técnica de transportes da prefeitura não respondeu
O Diário do Transporte procurou na manhã de sexta-feira, 16, o diretor da AESA – Associação do Sistema de Transporte de Santo André, que reúne as empresas do Consórcio União Santo André, Luiz Marcondes de Freitas Júnior, questionando se há previsão de renovação da frota com ônibus zero quilômetro, assim como fizeram recentemente as empresas SBC Trans (São Bernardo do Campo), Suzantur (Mauá) e Vipe (São Caetano do Sul), que operam nas cidades vizinhas de Santo André.
Marcondes não respondeu.
A reportagem procurou na sexta-feira o diretor da Suzantur, Claudinei Brogliato, que disse que responderia nesta segunda-feira, embora a empresa esteja dentro dos parâmetros de idade de frota.
QUEM É QUEM NOS TRANSPORTES DE SANTO ANDRÉ:
O Consórcio União Santo André é formado pelas seguintes empresas:
Base Operacional 01 – Viação Guainazes / Viação Curuçá (proprietário Ronan Maria Pinto).
Base Operacional 02 – Viação Vaz (proprietário Ozias Vaz)
Base Operacional 03 – TCPN – Transportes Coletivos Parque das Nações (proprietário Carlos Sófio)
Base Operacional 04 – ETURSA – Empresa de Transporte Urbano Rodoviário de Santo André (proprietário Ronan Maria Pinto).
Base Operacional 05 – EUSA – Empresa Urbana de Santo André (proprietário Baltazar José de Sousa)
Linhas Troncais e Alimentadoras do Sistema de Vila Luzita:
Suzantur (proprietário Claudinei Brogliato) – operação emergencial e depois a título precário até licitação.
Até 07 de outubro de 2016, era Expresso Guarará, da família Passarelli.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
Fonte: Diário do Transporte
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