11ª edição da Bus Brasil Fest bateu recorde de veículos apresentados e foi uma oportunidade de fazer um passeio pela história do ônibus
ADAMO BAZANI
Atualmente, a imagem do transporte público não é uma das melhores junto à população.
Uma pesquisa com 7825 pessoas em 35 cidades, realizada de forma inédita em parceria entre a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos – NTU, que reúne mais de 500 empresas de ônibus no País, e a CNT – Confederação Nacional do Transporte, demonstrou que cresce a insatisfação dos brasileiros com o transporte público, principalmente com os ônibus. O modal ônibus deixou de ser utilizado por parcela considerável da população. Entre os entrevistados, 38,2% deixaram de utilizar o ônibus como meio de transporte público, sendo que 16,1% deixaram de utilizar totalmente e outros 22,1% diminuíram o uso. Comparativamente com o cenário identificado na pesquisa realizada em 2006, houve um aumento de 24,2% dos brasileiros que diminuíram ou deixaram de utilizar totalmente o ônibus para deslocar-se nos municípios. Relembre pesquisa: https://diariodotransporte.com.br/2017/08/30/tarifa-e-o-principal-problema-do-transporte-coletivo-revela-pesquisa-nacional/
Os motivos para isso são os mais variados e vão desde o peso das tarifas para o orçamento dos passageiros, a qualidade dos serviços e até os escândalos envolvendo o setor, como os que ocorreram no Rio de Janeiro e em parte do ABC Paulista.
Mas o transporte público é essencial e, mesmo com todas as necessidades de melhorias, suas vantagens para a sociedade precisam ser lembradas ao cidadão comum que, nervoso pela situação que não considera ideal, não consegue enxergar os benefícios que os transportes coletivos proporcionam à sua vida. Entres estes benefícios, por exemplo, estão o acesso que os transportes coletivos garantem aos direitos elementares como saúde, emprego e educação; a redução da poluição e congestionamentos, além de permitir uma ocupação mais humana e inteligente das cidades pelas pessoas e não por veículos.
Os transportes também possuem um papel fundamental para a história das cidades. Por meio de ônibus antigos e simples que enfrentavam atoleiros e vias difíceis de serem percorridas, é que empreendedores do setor atenderam de maneira rápida as necessidades de deslocamentos nas áreas urbanas que cresciam numa velocidade nunca antes vista até o início dos anos 1950, em especial no pós Segunda Guerra Mundial.
Neste domingo, 26 de novembro de 2017, foi realizada na Praça Charles Miller, em frente ao Estádio do Pacaembu, a 11ª edição da BBF – Bus Brasil Fest, que representou oportunidades de trazer à tona a importância dos transportes, entender a história da mobilidade e, por meio desta história, sem achismos, vislumbrar alternativas para melhorá-la. Entres os objetivos do evento estavam valorizar a história e a evolução dos transportes por ônibus, a contribuição diária do setor no crescimento das cidades, mostrar que o ônibus tão discriminado é um parceiro no dia a dia das pessoas e também ser uma oportunidade de despertar o lado lúdico do ônibus.
E, pela recepção das pessoas, estes objetivos foram cumpridos.
Foi a maior BBF da história. A primeira edição, em 2001, reuniu oito ônibus e 50 visitantes. No início deste ano, a 10ª edição reuniu 49 ônibus e um público de 8 mil pessoas, segundo os organizadores, que são admiradores de ônibus, os chamados busólogos. Já a 11ª edição, que ocorreu neste domingo, conseguiu colocar na frente do estádio do Pacaembu, 140 veículos. Até o fechamento desta reportagem não havia estimativa de público por parte dos organizadores.
Além de modelos antigos e novos, alguns zero quilômetro, o que marcou mais uma vez o evento foi o olhar diferenciado que as pessoas que não são admiradoras de ônibus passaram a ter em relação a este meio de transporte.
“Estava passando por aqui, porque sempre faço caminhada aqui aos domingos e me chamou a atenção. Achei muito bonito mesmo. Tem ônibus aqui que fez parte da minha juventude, como aquele trólebus que me despertou lembranças boas” – disse a aposentada Esmeralda Assunção, de 62 anos, ao se referir a um ACF-Brill, de 1949, um dos primeiros trólebus a circular na cidade de São Paulo.
O ônibus é tão importante na vida das pessoas, por estar no seu dia a dia, que para muitas acaba virando uma motivação.
É o caso de João Vitor, que não tem quase 100% da visão. O jovem conhece os modelos de ônibus pelo barulho e resume o veículo em uma só palavra: “Paixão”, disse emocionado.
João Vitor foi incentivado pelo irmão que trabalhou com caminhão e depois com ônibus.
Esta edição da BBF recebeu o apoio de expositores particulares, que levaram modelos dos mais diversos portes e anos, e também de gerenciadoras de transportes, como EMTU – Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos e a SPTrans- São Paulo Transporte, na divulgação.
A valorização que a SPTrans deu a esta edição do evento foi tão grande que praticamente todas as empresas do subsistema local (ex-cooperativas) e do estrutural (linhas maiores) compareceram com um ou mais veículos. A gerenciadora da capital paulista distribuiu miniaturas de papel, exibiu um painel com números dos transportes da cidade de São Paulo e fez questão, em conjunto com a Express, operadora da área 4, da zona Leste, apresentar parte da nova frota de 60 ônibus novos adquiridos pela empresa.
“Todos nós andamos de ônibus. Vi modelos aqui dos anos 50 e 60. O trólebus ACF Brill são a cara de São Paulo. Os ônibus mais modernos também mostram como os transportes evoluíram, tanto os modelos urbanos como os rodoviários. Um evento como este tem o efeito de chamar a atenção para o transporte público. O transporte público que é a solução melhor para a mobilidade das cidades. Este evento faz com que as pessoas o entendam e o valorizem” – disse
Na opinião de Avelleda, que esteve na exposição, ainda parte da sociedade tem uma visão distorcida sobre mobilidade urbana.
“Outro dia, num almoço, reclamaram que por algumas faixas de ônibus passam poucos coletivos. Eu expliquei que não é assim que se faz a conta. Não é o número de veículos que importa e sim o de pessoas atendidas é o que vale. Em São Paulo, um carro transporta em média 1,3 pessoa, já um ônibus articulado ou biarticulado do sistema da SPTrans transporta de uma só vez 200 pessoas” – exemplificou o secretário de transportes.
Avelleda tem uma história relacionada com os transportes, desde antes mesmo atuar na direção do Metrô e CPTM e, agora, na secretaria da capital paulista.
“Eu tenho uma conexão com o mundo dos ônibus e dos caminhões. Meu pai trabalhou a vida toda numa fábrica, a Mercedes-Benz. Eu mesmo trabalhei numa concessionária Mercedes no começo da minha vida profissional. Eu tenho uma conexão emotiva, a gente morava em frente à fábrica da Mercedes-Benz, em São Bernardo do Campo. Os meus desenhos de criança são aquela fábrica, aquele prédio com a estrela em cima e um caminhão estacionado ao lado. Para mim é muito emocionante estar envolvido na gestão do sistema de ônibus, que me conecta diretamente com as minhas raízes” – conta Avelleda que se emocionou com um ônibus escolar semelhante ao que via quando criança em Curitiba e com os “Flechas”, da Viação Cometa, os históricos ônibus parecidos com os modelos norte-americanos.
“Trabalhei nessa revendedora da Mercedes-Benz quando eu estava no primeiro ano da faculdade no curso de Direito. No segundo ano, surgiu uma oportunidade de estágio na área. Aí advoguei, advoguei, trabalhei na área de saneamento básico, em direito empresarial, tive escritório até que, em 2002, fui convidado pelo [ex] secretário [de Transportes Metropolitanos], Jurandir Fernandes, para ser gerente jurídico do Metrô [de São Paulo]. Aí me conectei de novo com o sistema de transportes. Fiquei como gerente jurídico até 2007, quando me tornei diretor de assuntos corporativos. Em 2008, por convite do secretário [de Transportes Metropolitanos], José Luiz Portella e do governador José Serra, eu virei presidente da CPTM [Companhia Paulista e Trens Metropolitanos]. Em 2011, a convite de novo do secretário Jurandir Fernandes e do governador Geraldo Alckmin me tornei presidente do Metrô. Depois fui trabalhar no Metrô do Rio de Janeiro e desde o início de 2017, sou secretário de Mobilidade e Transportes da cidade de São Paulo” – relembra Avelleda.
OUÇA NA ÍNTEGRA:
Alguns empresários de ônibus fizeram questão de participar do evento e ouvir de perto o que as pessoas tinham a dizer sobre os serviços e sobre os veículos.
“Deveríamos multiplicar este evento pelo Brasil e, assim, multiplicar a cultura do transporte. É preciso mostrar como o transporte coletivo tem evoluído, apesar de que temos muito mais ainda a fazer, a população merece o transporte a cada dia de mais qualidade. Temos de pensar que as cidades são coletivas. Temos de integrar o ônibus, o metrô, o trem, o veículo menor, a bicicleta e o deslocamento a pé. É esta complementariedade que vai elevar São Paulo e outras grandes cidades do Brasil para um outro patamar de transporte coletivo. Junto com a infraestrutura e tecnologia, temos certeza que estamos no caminho certo para superar os problemas que vivemos no trânsito, por exemplo.”- disse a proprietária da MobiBrasil, Niege Chaves. A MobiBrasil opera na capital Paulista, na área 5 da EMTU (correspondente ao ABC Paulista), em linhas municipais de Diadema e em Recife e região metropolitana.
A empresária Angela Agoston, da Express, empresa que entregou os ônibus novos, contou que a companhia tem qualificado os transportes na região. Angela também destacou a importância do evento.
“A Express tem desenvolvido um trabalho muito sério e elevado os padrões de atendimento, hoje a área 4 se tornou umas das regiões de maior tranquilidade para operar. São excelentes estes eventos para mostrarmos à população que estamos investindo. Esse contato com o público é essencial e prezamos por isso, contou”
A postura das empresárias e do secretário de transportes Avelleda mostra uma mudança que tem ocorrido de maneira gradativa entre os donos de empresas de ônibus. A sociedade está mais consciente e as informações são cada vez mais necessárias em qualquer atividade, ainda mais nas que se relacionam diretamente com o público, como o transporte de passageiros.
Investir em comunicação é, sem dúvida, hoje para uma empresa de ônibus tão necessário quanto comprar pneus, diesel e modelos novos. E comunicação, é muito mais que propaganda. É informar e debater os assuntos relacionados à mobilidade, mesmo os não tão confortáveis para gestores públicos e empresários, de maneira transparente e honesta.
Abaixo, as fotos de alguns dos 140 ônibus exibidos na BBF.
Transportes menos poluentes também foram destaque, com exibição de dois trólebus em operação na capital paulista, um Dual Bus (trólebus + híbrido) do Corredor ABD, um ônibus a Gás Natural e um a etanol
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
Fonte: Diário do Transporte
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