Veja relação de projetos para o financiamento de gratuidades. Uma em cada seis viagens de ônibus no Brasil não têm cobrança de tarifas
ADAMO BAZANI
Ao menos 60 viagens de ônibus por segundo não têm cobrança de passagem. O número faz parte do universo de 40 milhões de deslocamentos diários feitos por ônibus urbanos e metropolitanos no Brasil e representa que de seis viagens de ônibus, uma é gratuita, de acordo com a NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, que reúne em torno de 500 viações no país.
Até aí, não haveria nenhum problema na concessão destas gratuidades, caso não houvesse a atual injustiça na forma de financiamento destes benefícios. O custo recai quase que exclusivamente sobre o passageiro pagante.
Somado à constante perda de demanda dos ônibus, que chegou a 900 mil passageiros por dia em 2015, à ineficiência dos sistemas que não são remodelados pelas licitações realizadas quase que de forma improvisada, e do alto custo gerado pelos congestionamentos, que representam em torno de 15% dos gastos para operação de transportes, de acordo com o IPEA, o excesso de gratuidades explica o fato de a passagem de ônibus hoje no Brasil ser tão cara.
Não adianta o MPL – Movimento Passe Livre e outras organizações forçarem uma reivindicação de tarifa zero para todos, sem apresentar propostas que possam sair do papel. Hoje o Brasil nem ao menos consegue resolver o financiamento das atuais gratuidades.
Sim, a passagem de ônibus no Brasil é cara, os serviços ainda não satisfazem plenamente a sociedade, mas a tarifa não cobre os atuais custos.
Alternativas para formas de financiamento dos transportes públicos existem, inclusive em forma de projetos de lei ou propostas de emenda à Constituição, mas pelo andar da carruagem da política brasileira, não devem sair do papel tão já.
Acompanhe algumas:
– PEC 179-A/2007 – Cide Municipal: A Proposta de Emenda à Constituição, de autoria do atual secretário municipal de transportes de São Paulo, Jilmar Tatto, quando era deputado federal em 2007, prevê a criação de uma Cide – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – municipal sobre os combustíveis. A PEC ainda tramita na Câmara. Em entrevista ao Blog Ponto de Ônibus, no 15 de janeiro de 2016, o presidente da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, Otávio Vieira da Cunha Filho, disse que se R$ 0,20 da gasolina fossem destinados aos transportes, seria possível cobrir de 30 % a 35% dos custos dos transportes coletivos, havendo assim uma redução no valor das tarifas.- Relembre em:https://blogpontodeonibus.wordpress.com/2016/01/15/entrevista-presidente-da-ntu-defende-fundo-para-transportes-e-considera-licitacao-em-sao-paulo-confusa/
No último dia 28 de abril de 2016, o secretário Municipal de Transportes de São Paulo, Jilmar Tatto, disse em evento na capital paulista que se houvesse uma Cide – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – municipal sobre os combustíveis, cobrando 10 centavos por litro comercializado, a cidade teria uma arrecadação anual extra de R$ 625 milhões. Este valor, de acordo com Jilmar Tatto, seria destinado, por lei federal, para baratear as passagens de ônibus.
A lógica é a busca de uma justiça no uso do espaço urbano e no rateio dos custos de transportes. Quem se locomove de carro ocupa proporcionalmente até oito vezes mais espaço que um passageiro que está no ônibus e polui em torno de 17 vezes mais. Assim, pela proposta, seria justo que esse cidadão contribuísse para os deslocamentos daqueles que poupam o espaço urbano, reduzindo o trânsito e a poluição. Ao reduzir as tarifas, os transportes públicos seriam mais interessantes e um maior número de pessoas deixaria o carro em casa.
Levantamento do IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas revela que os congestionamentos nas cidades podem deixar as tarifas de ônibus mais de 15% mais caras: o congestionamento acarreta um custo adicional na tarifa para os usuários do transporte coletivo, quais sejam: São Paulo (15,8%); Rio de Janeiro (9,6%); Campinas (6,4%); Belo Horizonte (6,2%), dentre outras cidades. Isso porque os veículos de transporte coletivo gastam mais combustíveis e horas de trabalho presos no trânsito.
– PL3866/2015 – Fundo do Idoso para os Transportes: O Projeto de Lei do deputado federal Júlio Lopes prevê o uso da parte das verbas do Fundo Nacional do Idoso para custear as gratuidades para passageiros com idade acima de 65 anos nos transportes urbanos e metropolitanos. A proposta foi remetida no último dia 18 de dezembro de 2015, às Comissões de Seguridade Social e Família; Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania. Só depois será encaminhada ao Senado, se passar pelos deputados. O Fundo Nacional do Idoso foi instituído pela lei 12.210, de 20 de janeiro de 2010, para ser “destinado a financiar os programas e as ações relativas ao idoso com vistas em assegurar os seus direitos sociais e criar condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.” Com a inclusão dos transportes no sexto artigo da Constituição em 2015, sendo classificados agora como direitos sociais, a tramitação deve seguir de maneira mais rápida e sofrer uma contestação a menos.
PEC 01/2015 – Rateio igual da atual Cide: No último dia 27 de abril, a CCJ – “Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania”, do Senado Federal, aprovou a Proposta de Emenda à Constituição PEC 01/2015, do senador Wellington Fagundes, que prevê a distribuição da Cide – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico sobre os combustíveis em partes iguais entre União, estados e municípios. A medida é considerada pelos senadores que participaram da votação essencial para auxiliar os municípios que se encontram em situação financeira delicada e também para ampliar os investimentos em mobilidade urbana. As maiores responsabilidades e, consequentemente custos, para gestão e operação dos transportes são justamente dos municípios. A proposta quer assim tornar mais justa a divisão dos recursos para que os deslocamentos individuais financiem o transporte coletivo. Atualmente, a Constituição Federal destina 29% da arrecadação da Cide-Combustíveis aos estados e ao Distrito Federal e, desse total, 25% são repassados aos municípios. O critério de redistribuição considera o contingente populacional e a posição ocupada dentro do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Em razão disso, algumas cidades recebem mais recursos que outras.
Pelas regras em vigor, de cada R$ 100 arrecadados com a Cide-Combustíveis, a União fica com R$ 71 (71%) e repassa R$ 21,75 (21,75%) aos estados e ao DF. Aos municípios, são repassados apenas R$ 7,25 (7,25%).
Mas para a PEC vigorar, há um longo caminho: A proposta deve ainda ser submetida a dois turnos de discussão e votação no Plenário do Senado. Se aprovada, seguirá para a Câmara dos Deputados. Não há um prazo para que esta tramitação termine.
OUTRAS PROPOSTAS:
Há também outras propostas do setor de transportes e de especialistas, como por exemplo, a criação de um Fundo Nacional para o Financiamento dos Transportes. Isso possível agora pelo fato de, através da aprovação no ano passado, da PEC 90 – Proposta de Emenda à Constituição, da deputada Luiza Erundina, os transportes serem classificados pela Constituição como direito social e não apenas serviço essencial, como era antes.
Outras ideias são mais polêmicas, como a criação pelos municípios de pedágios urbanos ou a obrigatoriedade de o empregador pagar o Vale-Transporte para todos os funcionários, independentemente de eles irem trabalhar ou não de transporte público. Seria uma forma de também estimular os deslocamentos de transportes públicos e financiar quem já utiliza trem, metrô ou ônibus.
RECEITAS DEVERIAM AUMENTAR 50%:
Ainda de acordo com a NTU, hoje a operação dos transportes públicos em todo o país custa anualmente R$ 30 bilhões. No entanto, para que o serviço seja adequado, tanto em termos de qualidade quanto para o atendimento geral de uma demanda reprimida, seriam necessários pelo menos outros R$ 15 bilhões, totalizando R$ 45 bilhões anuais para os modelos atuais de sistemas.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
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