segunda-feira, 26 de junho de 2017

ASSISTA: “É um erro insistir no custeio do transporte público apenas pela tarifa”, diz especialista

Para especialista, grandes sistemas de ônibus e de trilhos precisam ter parte dos seus custos cobertos por toda a sociedade, não só pelos passageiros. Foto e texto: Adamo Bazani
Adriano Branco, um dos responsáveis pela modernização do sistema de trólebus em São Paulo, defende subsídios e maior participação de empresários em ônibus elétricos
ADAMO BAZANI
O transporte público é um Direito Social previsto na Constituição desde setembro de 2015, após aprovação de uma PEC – Proposta de Emenda à Constituição, de 2011, de iniciativa da deputada Luiza Erundina.
Até então, o transporte público era considerado serviço essencial. Muito mais que mudanças na nomenclatura, quando uma determinada área da vida dos cidadãos é elevada à condição de direito social, em tese, deve haver mais comprometimento das diferentes esferas de governo, desburocratização e novas fontes de custeio por meio de recursos públicos. Em tese, porque ainda na prática todas as possibilidades de o transporte público como direito social ainda não foram sentidas pela população.
O cenário praticamente é o mesmo de antes de 2015: tarifas altas, serviços ineficientes, empresas de transportes quebrando ou necessitando de auxílios externos (seja de ônibus ou de rede metro-ferroviária) e, claro, muita insatisfação.
É certo que em menos de dois anos não é possível mudar um quadro que reúne problemas crônicos, que são relacionados, inclusive, com crescimento desorganizado de praticamente todas as cidades brasileiras. Mas pelo menos, já daria para sentir algumas diretrizes mais sólidas, o que também não está sendo possível.
Num país em crise e com as contas públicas apertadas, pode parecer difícil falar em financiamento governamental do transporte coletivo para a população e já vai o alerta: nada de tarifa zero, mas usar recursos públicos para baratear e tornar mais atrativo um serviço que beneficia a todos, inclusive quem não faz uso dele.
Especialistas do mundo todo, inclusive do Brasil, com larga experiência na gestão pública e também em empresas privadas, são unânimes em defender a ideia de que a tarifa não pode ser a única fonte de custeio para os transportes no país.
O engenheiro Adriano Murgel Branco atua no setor de transportes públicos desde os anos de 1960. Hoje com 83 anos de idade, reúne experiência com visão de futuro, reunindo o que viveu no passado e as tendências em relação ao que pode ser aplicado nas ruas, corredores e trilhos brasileiros.
Adriano Branco foi um dos principais responsáveis pelo projeto Sistran, que revolucionaria o sistema de transportes na capital paulista, o maior da América Latina já em 1978, quando o plano foi implantado. Além de um aumento significativo da rede de trólebus, previa integrações com outros modais e uma nova geração de ônibus elétricos.
São Paulo receberia 1.280 trólebus novos e a rede seria ampliada em 280 km , que se juntariam aos 115 km já existentes na época.
O plano não foi plenamente colocado em prática por causa da falta de continuidade administrativa.
Adriano Branco defende subsídios e o financiamento público do setor de transportes, mesmo sendo operado por empresas privadas,
Segundo o engenheiro, com base em sua experiência, é possível notar que os transportes trazem lucro para toda a sociedade por meio de benefícios sociais e econômicos, as chamadas externalidades, que não são repassadas para o setor novamente.
O engenheiro dá o exemplo do Metrô de São Paulo, que tem um controle maior de suas contas e as externalidades.
Em 2016, o Metrô de São Paulo custou R$ 2,5 bilhões aproximadamente. Entretanto, os seus benefícios sociais como redução de tempos de viagem, de congestionamento, de veículos nas ruas, de poluição e dos custos de manutenção das vias, representou ganhos para a sociedade na ordem de R$ 12,5 bilhões, que não foram revertidos para este sistema.
Diário do Transporte e o Canal Mova-se fizeram uma entrevista exclusiva com Adriano Branco, que também defendeu a maior participação de empresários de ônibus na consolidação de uma tecnologia mais limpa. A participação dos empresários não apenas como compradores, mas como investidores e negociadores dessas novas tecnologias.
O engenheiro citou o exemplo do Grupo Ruas, maior frotista de São Paulo, que é um dos sócios da Caio, encarroçadora de ônibus, como operador-investidor, e concorda que o Corredor Metropolitano ABD, entre São Mateus e Jabaquara, nas zonas Leste e Sul de São Paulo, passando por municípios do ABC Paulista, é bem-sucedido também porque a operadora de trólebus atua na fabricação desses sistemas, além, claro, de outros fatores.
Adriano Branco diz que atual política de financiamento de transportes públicos baseada apenas nas tarifas é um obstáculo e um engano, que impede o desenvolvimento do setor e melhorias substancias para os deslocamentos das pessoas.
“A ideia de que empresa privada só pode trabalhar com tarifas equivalentes aos seus custos é um obstáculo ao desenvolvimento de uma política financeira melhor [para os transportes]. Isso sempre foi um obstáculo previsto pelas administrações, que a tarifa precisa ser igual ao custo, se não empresário privado não se interessa. É um engano. Não há outro caminho, deve haver uma participação maior do poder público no custeio dos transportes”  defendeu o especialista.
Acompanhe abaixo a entrevista na íntegra:
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

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