Empresa de Mauá que financiou 100 ônibus terá de tirar dinheiro de outras fontes porque os recursos são suficientes para menos veículos
ADAMO BAZANI
Quando tudo parecia que ia deslanchar para o Refrota 17, um programa lançado oficialmente em janeiro pelo Governo Federal, com recursos de R$ 3 bilhões provenientes do FGTS para a troca de 10 mil ônibus urbanos no País, o sistema de financiamento tem mais um entrave que pode novamente desestimular a aquisição de novos coletivos.
O financiamento é atrelado ao número de veículos que deve ser comprado e não à quantidade de ônibus que podem ser adquiridos com os recursos liberados. Ocorre que esta cláusula pegou frotistas de surpresa.
Como a aprovação do financiamento tem demorado para sair, pode haver diferença entre a quantidade de ônibus estipulada no momento da adesão da empresa ao Refrota e a quantidade que é possível ser adquirida no momento que o dinheiro é liberado. Isso porque, no período de espera por causa da burocracia, pode haver aumento de preços de chassis, carrocerias e componentes.
Foi o que aconteceu com a empresa Suzantur, operadora dos transportes municipais em Mauá, na Grande São Paulo.
A companhia de ônibus foi a primeira no País a conseguir liberação de recursos.
Apesar de o programa ter sido lançado em janeiro, o primeiro financiamento foi assinado em 12 de junho de 2017 justamente pela Suzantur.
Os recursos foram de R$ 30,3 milhões para 100 ônibus, sendo que R$ 28,7 milhões financiados e R$ 1,5 milhão de contrapartida da empresa.
Entretanto, o dinheiro não será suficiente para comprar os 100 ônibus, de acordo com a promessa inicial.
Da primeira solicitação de adesão da Suzantur até a liberação dos recursos foram consumidos em torno de quatro meses. Nesse período, os valores das carrocerias e chassis foram reajustados.
Ocorre que como a regra vincula o financiamento somente à quantidade de frota e não leva em conta a variação dos preços dos veículos, pelo Refrota não será possível comprar os 100 ônibus.
Em entrevista ao Diário do Transporte, o proprietário da Suzantur, Claudinei Brogliato, garantiu que os 100 veículos serão adquiridos para Mauá. Se não houver solução com a Caixa, entretanto, a empresa vai bancar a diferença com os próprios recursos.
“ Quando negociamos com a Caixa Econômica, a média do preço dos chassis do ônibus do tipo que precisávamos era de R$ 300 mil e mais R$ 3.100 pelas câmeras, o que daria a R$ 303,1 mil por veículo. Assim, os R$ 30,31 milhões seriam suficientes. Mas quando os recursos foram liberados, fomos cotar preços nos fornecedores e os valores de mercado eram outros. O midi (micrão) sairá por R$ 330 mil (R$ 176 mil do chassi Mercedes-Benz OF-1519 e R$ 154 mil da carroceria Marcopolo Torino). Já o ônibus convencional vai custar R$ 354 mil (R$ 186 mil do chassi OF-1721 e R$ 168 mil da carroceria Marcopolo Torino para convencional). Os 100 ônibus vão sair por R$ 33,73 milhões. Se não houver mudança por parte da Caixa, vamos manter a compra, mas ter de complementar mais de R$ 3,4 milhões somados ao R$ 1,5 milhão de contrapartida que já era previsto. Vamos ter de desembolsar R$ 4,9 milhões. Até agora, o Refrota nos prejudicou” – disse Brogliato.
O empresário também contou que não foi informado pela Caixa sobre esta regra, que, segundo ele, não estava clara no contrato.
“Temos esta condição de complementar [a diferença entre os recursos liberados e o atual preço de mercado], mas tem muita empresa que não tem. O pior é que quando assinei, não sabia e nem fui informado disso. Não teve clareza” – lamenta.
Também em entrevista ao Diário do Transporte, o presidente da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, Otávio Cunha, disse que a regra pode desestimular outros empresários a procurarem o Refrota.
“Essa regra tem de ser mudada. Há variação de preços e o financiamento deve levar em conta isso. Nós vamos pedir ao Ministério das Cidades que a regra seja atrelada ao valor do crédito e ao que é possível comprar com ele, e não à quantidade de frota” – disse Otávio Cunha.
O Refrota demorou para sair do papel por causa de outro problema burocrático.
Inicialmente, a Caixa Econômica Federal exigia que os ônibus tivessem seguro.
Mas não existe seguro para veículos de transporte coletivo no mercado.
O modelo de seguro proposto também era considerado sem vantagem pelos empresários.
A franquia era de 75% do valor do ônibus novo, ou seja, na prática o seguro iria cobrir apenas 25% do valor do veículo. Um ônibus pode ter preços entre R$ 250 mil e R$ 1,2 milhão, dependendo do porte tecnologia e configuração.
O Diário do Transporte procurou a CEF – Caixa Econômica Federal desde a manhã de quarta-feira, tanto por e-mail como por telefone, mas o banco público, responsável pelo Refrota, e somente nesta quinta, houve a resposta.
Segundo a Caixa, por meio da assessoria de imprensa, são seguidas as regras do Programa Pro-Transporte
DT: Por que a regra vincula o financiamento à quantidade de frota no momento de adesão e não leva em conta variação de preços?
CEF: As regras de financiamento seguem as condições dispostas no Manual de Fomento do Agente Operador do FGTS do Programa Pró Transporte, e as considerações quanto a variação de preços, expressas também nos capítulos Capítulo IV e V.
O Manual de Fomento do Agente Operador do FGTS do Programa Pró Transporte pode ser acessado no endereçohttp://www.caixa.gov.br/ Downloads/fgts-manual-fomento- agente-operador/MFOM_PRO_ TRANSPORTE_VERSAO_3_7.pdf
DT: Qual o tempo médio entre a manifestação de interesse da empresa de ônibus e a liberação dos recursos?
CEF: O tempo entre a manifestação de interesse do proponente e a liberação de recursos tende a variar, considerando que cada processo de avaliação de crédito demanda análise de diversos elementos que diferem de uma proposta e outra, como por exemplo: aspectos financeiros, cadastrais, jurídicos, entre outros.
DT: Além da Suzantur Mauá, quais empresas conseguiram liberação de financiamento pelo Refrota? Qual o nome delas, a quantidade de ônibus, o montante de recursos e onde operam.
CEF: Informação protegida por sigilo bancário.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
Fonte: Diário do Transporte
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